4 de jan. de 2012

Última impressão

e não é dor
nem tristeza
o que as velhinhas sentem
sentadas nas suas portas
conversando
e relembrando os tempos de juventude e beleza
ou com suas agulhas de crochê
e o novelo de lã azul


azul é a cor da velhice?

azul faz bem aos velhos?

azul,
como no céu
e faíscas no fogão a gás
e as janelas velhas de minha casa
e minha caneca de café com leite

e no fim as dores e suas desgraças parecem ter alguma tonalidade de azul
que sente e dói no fundo da retina dos olhos castanhos
ou na cadeira do dentista
o medo de ser autopsiado e suas vísceras vendidas
a qualquer cachorro ou urubus vigiando dos céus,
azuis,
Roberto Carlos no fim de ano, especial e azul
ponte de cidade pequena para outra cidade pequena, azul
a esferográfica sob a pauta
carne estragada fora da geladeira
tristeza, se falarmos inglês
refil do inseticida elétrico
meninos, rapazes, homens e velhos
outra vez idosos com suas mantas azuis

não funciona, mas você acredita
e escolas em ruínas com suas janelas e portas azuis e cadeados, dourados,

o último dos espetáculos cintilantes da aurora boreal das cabeças malditas de Lajedão
notas de cem, noutro tom, azul
dizem “agüenta aí, já estou chegando”
pulando seus muros altos podres de água de chuva, água azul e chuva azul, no livros é, azul,
nos desenhos também
quebrando, se é que se quebra, os “havaianas” quando se queria correr
o rádio tocando música barulhenta, “agüenta aí, já estou quase”
aulas de idiomas estranhos que assustam os velhos, e velhos ainda não tão velhos assim.

azul, como na fila do velhos que não tem dignidade, sentados ou em pé, esperando sua vez,
seus papéis, azuis,
azulejo de banheiros velhos, azuis,
ninguém que venha do azul dos céus cinzas, dessa época do ano
não vi as cores das estrelas, brancas,
nos livros são amarelas,
nos desenhos também

e a primeira impressão é que o azul tão velho, que nem os velhos conhecem o nascimento do azul,
ou dos céus, azuis,
por fim

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